Os dois tipos de marketing Marketing Político e Marketing Comercial são a mesma coisa ou podem ser trabalhados da mesma forma? A pergunta causa controvérsia entre os profissionais e estudiosos de ambas as áreas. Há os que acreditam que se tratam de ações da mesma natureza, devido à semelhança na utilização de ferramentais e na forma de focar o público alvo. Outros autores são contrários a essa comparação, uma vez que acreditam que a natureza do consumo de bens e produtos não pode ser comparada à escolha de um candidato na hora da eleição, mesmo que ambas as formas de marketing possam vir a utilizar estratégias semelhantes em alguns casos e momentos. Para que possamos chegar a uma conclusão sobre o tema, vale a pena fazermos um apanhado histórico das duas técnicas (já que nem todos concordam que o marketing possa ser uma ciência).
O Marketing Comercial, como a arte de conquistar e manter clientes, surgiu por volta dos anos 40 no Estados Unidos, orientado para o produto – as empresas faziam o produto, anunciavam e o consumidor os comprava nos pontos de distribuição. Nos anos 70 e 80, o Marketing Comercial teve que se voltar para o mercado, já que passou a haver mais produtos que consumidores. Nós anos 90, foi preciso haver mais um avanço e o Marketing Comercial voltou o seu foco para o consumidor. Saímos, então da pergunta o que você tem para vender, passamos para o que o mercado comprará e chegamos no que o consumidor comprará? No final do século passado e início desse, o Marketing Comercial ganhou outras sofisticações com a tecnologia, trazendo a tona o Marketing de Relacionamento, o Database Marketing e o Marketing Um a Um – onde o gosto individual e levado em conta acima dos interesses do mercado e do segmento. Nesse caso a produção e a comunicação deixam de ser de massa e passa a focar o indivíduo (claro, que para haver viabilidade econômica é preciso atender individualmente um grande número de consumidores).
A história do marketing político começou alguns anos depois, também nos Estados Unidos. Segundo Rubens Figueiredo, a primeira vez que um candidato apelou para que uma agência de publicidade fizesse sua propaganda na televisão foi na campanha de 1952, nos EUA. “O candidato general Eisenhower. O marketing político estava na sua infância. A principal preocupação dos markeólogos era adaptar o discurso do candidato às especialidades da televisão.” “Em 1956, o marketing político já se tornava um instrumento obrigatório para uma campanha presidencial americana. Em 1960, o marketing político começa a ganhar contornos definitivamente modernos. A televisão passou a desempenhar um papel preponderante nas campanhas. Também foi em 1960 que os americanos assistiram, pela primeira vez, um debate de candidatos à Presidência da República. Na Inglaterra, foram os conservadores que, em 1959, confiaram pela primeira vez sua campanha a uma agência de publicidade. Na França foi em 1965 que o candidato Leucaneut recorreu à empresa “Services e Mèthodos”, que também fazia o lançamento da marca James Bond no mercado francês. No Brasil, somente a partir das eleições majoritárias de 1982, o marketing político passou a ser usado regularmente nas campanhas políticas.”
Como podemos ver através do relato de Rubens Figueiredo, a introdução do Marketing Político nas campanhas eleitorais aconteceu bem mais recentemente, não só nos EUA e o resto do mundo, mas principalmente no Brasil. Algumas técnicas foram literalmente copiadas do Marketing de Produto e Serviços: a utilização de pesquisas quantitativas e qualitativas para avaliar o comportamento do eleitor, a organização de um planejamento estratégico e a utilização de técnicas de comunicação são os principais exemplos desse fato.
Neste sentido é que Rubens Figueiredo e outros autores estabelecem uma relação de semelhança entre os dois tipos de marketing. “Marketing Político é um conjunto de técnicas e procedimentos que tem como objetivos adequar um(a) candidato(o) ao seu eleitorado potencial, procurando fazê-lo, num primeiro momento, conhecido do maior número de eleitores possível e, em seguida, mostrando-o diferente de seus adversários, obviamente melhor que eles”, afirma o autor. “O marketing político tem tudo a ver, portanto, com o marketing de produtos. Quando se lança um produto novo, é preciso ver se ele é viável, estudar o consumidor, identificar quem tem poder aquisitivo para consumir, qual é o posicionamento dos concorrentes, como se deve direcionar a propaganda e assim por diante.”
A semelhança entre as duas técnicas cresceu ainda mais com a evolução do Marketing Comercial. A utilização dos 4Ps de Jerome McCarthy (Produto, Preço, Praça e Promoção), talvez, não se adequasse tão bem ao Marketing Político, uma vez que o fator preço tem pouca relevância nas campanhas políticas. Já os 4 As de Raimar Richres (Análise, Adaptação, Ativação e Avaliação), podem ser perfeitamente aplicados ao Marketing Político, se levarmos em conta a afirmação comum entre os especialistas: “o processo de elaboração e implementação de uma estratégia de Marketing Político envolve três etapas: primeiro é feito um diagnóstico; no segundo momento é elaborada uma estratégia propriamente dita e, finalmente, definisse quais os meios deverão ser utilizados na implementação de uma estratégia definitiva. É preciso estabelecer uma mensagem e quais os meios de comunicação mais adequados para sua difusão”. Mas nem tudo são semelhanças.
Ao fazermos uma comparação entre Marketing Comercial e Marketing Político cabe ressaltar também as diferenças. De acordo com alguns cientistas políticos, “a primeira diferença reside no fato de que o Marketing Comercial oferece um produto que é percebido pelo consumidor como necessário. Por serem necessários, há uma razoável certeza de que os produtos serão adquiridos. A decisão do consumidor, portanto, não se concentra no produto (leite, sabão, móveis, perfumes etc) e sim na escolha da marca que vai adquirir. Já o produto oferecido pelo Marketing Político não é percebido como necessário para um número expressivo de eleitores. Para a maioria das pessoas, a política possui um interesse secundário e marginal nas suas vidas. Não fora a obrigação legal de votar, muitas pessoas não se dariam ao trabalho de ‘adquirir’ o produto político (eleger um candidato).” Os mesmos autores também apresentam outras quatro diferenças.
A segunda diferença e que “no Marketing de Consumo, é o próprio consumidor quem toma a iniciativa de procurar o produto e escolher entre as marcas, exatamente porque ele é percebido como necessário. No Marketing Político, o eleitor/consumidor tende, na sua maioria, a permanecer passivo, esperando ser contactado, persuadido e motivado a votar naquela marca (candidato) que, com maior eficiência, conseguiu sua atenção e simpatia.“ A terceira diferença citada estaria ”na natureza da satisfação que o consumidor/eleitor recebe ao decidir comprar/votar. No Marketing de Consumo, a compra do produto dá ao consumidor uma satisfação imediata e previsível. O ato de oferta do produto e de suas propriedades se consuma pela compra. É um ato concluso e terminado.
No Marketing Político, excluída a hipótese da satisfação psicológica, o ato de oferta do produto (candidato) é um ato em aberto, cercado de incertezas e imprevisibilidades. O que se adquire não é um bem, nem tampouco a certeza dos benefícios prometidos, mas no máximo a esperança.“ A quarta diferença residiria na natureza da concorrência, característica de cada um dos dois tipos de marketing. “No Marketing de Consumo, como regra, cada marca anuncia as qualidades e virtudes de seu produto, abstendo-se de desqualificar as marcas de seus concorrentes. Já no Marketing Político, a propaganda negativa não somente é legítima como praticada por todos - ou pelo menos a maioria. Atacar o candidato adversário, buscando desqualificá-lo aos olhos do eleitor, é, no mínimo, tão importante para cada candidato quanto alardear suas virtudes e excelências. Como em princípio todos podem atacar a todos, cada candidato precisa também gastar tempo e recursos para defender sua imagem.”
Por fim, a quinta diferença encontra-se na condição temporal em que a decisão de compra/voto é tomada. “No Marketing Comercial, o vendedor decide com liberdade qual o período de tempo que vai dedicar à sua campanha de vendas. De sua parte, o consumidor pode comprar o produto a qualquer momento, escolhendo aquele que mais lhe convier. No Marketing Político, o tempo de campanha é legalmente definido e é somente dentro deste tempo que todas as campanhas, de todos os candidatos, devem ser feitas. De sua parte o eleitor deve, obrigatoriamente, tomar sua decisão de voto em apenas um dia e exclusivamente neste dia.“
Feitas essas considerações, podemos concluir que o Marketing Comercial e o Marketing Político não são a mesma coisa ou podem ser trabalhado da mesma forma. Tratam-se de ações de natureza completamente diferente, apesar de algumas das técnicas do primeiro terem sido adaptadas para o segundo. Outras questões precisam ser levadas em conta na hora de trabalharmos o Marketing Político, como os valores da esfera pública. Se não levarmos em considerações esses fatores, a simples técnica fatalmente redundará em fracasso eleitoral. Poderíamos ainda estender a discussão, avaliando a diferença entre Marketing Político e Marketing Eleitoral, partido do princípio que o primeiro é algo mais permanente – usado após as eleições, quando o político vitorioso tem a preocupação em sintonizar suas administração com os anseios dos cidadãos – e o segundo seria usado apenas na hora de buscar o mandato. Mas isso seria outra história.